terça-feira, 24 de agosto de 2010

Meio Dia

Meio dia, sentado na frente do computador, sentindo só uma tristeza que não sabia de onde vinha. Talvez soubesse, mas negava. É incrivelmente mais fácil negar situações difíceis, das quais não se tem controle, do que aceitar que na realidade não se tem controle algum sobre essas situações. O trem passou mais uma vez em frente à janela, “um dia pego esse trem”, pensava. Tinha tido coragem o suficiente para chegar até ali, mas ficava petrificado em não saber o que poderia acontecer em seguida. Só o que podia fazer era tentar planejar. Esse era o seu forte. Sempre planejou todos os seus passos e incrivelmente as coisas sempre aconteciam como ele planejava, menos agora. Apostou todas as suas fichas em um recomeço, mas, imaginar o futuro e vivê-lo são coisas bem diferentes. O futuro simplesmente não aconteceu como imaginava. Não foi difícil sair de onde estava, e agora estava sendo ainda mais difícil realmente deixar o lugar. Ainda nem tinha parado para pensar no lugar novo. Chamaria de lar algum dia? Não sabia como era, sua geografia, as pessoas. Alguns problemas de sua vida antiga pareciam não se resolver. Lembrou que havia partido para poder conseguir ser o que sempre quisera ser. Era escritor. Não era só uma vontade, era como se algo o obrigasse a seguir o seu “destino”. Pensou que poderia fazê-lo escrevendo. Em sua vida anterior (vamos chamar assim) não conseguia entrar em contato consigo mesmo. Como poderia sentir falta de um lugar que não gostava? Mais um trem passou. Será que alguma daquelas pessoas, ao vê-lo no apartamento pela janela do trem pensava “um dia largo tudo e vou morar sozinho num apartamento”? Sentia-se só. Estava só. A solidão assusta. Ela nos faz pensar em tudo o que fizemos de errado na vida. Ela nos obriga a pensar e concluir que na verdade estamos sozinhos. Ficou com fome, ainda não tinha nenhuma idéia inspiradora. Foi gastar alguns de seus últimos trocados no almoço da bodega da esquina. Ao voltar, sentou-se novamente à janela, ainda sem ideias. O trem passou novamente. Dessa vez fixou seus olhos em um homem sentado numa das janelas do trem. Ficou pasmo, mas o homem era muito parecido com ele. É isso, iria escrever um romance sobre dois irmãos que haviam se separado, mas que se reencontravam muitos anos depois. Começou a escrever. No dia seguinte, no mesmo horário sentou-se à janela esperando ver aquele homem novamente. Lá estava ele. Desta vez parecia que o homem o viu. Ficou empolgado e escreveu como um louco. Não sei se loucos escrevem. No dia seguinte lá estava ele novamente. O homem, agora acenava para ele num olhar de simpatia misturada com estranheza, eram mesmo bem parecidos, o homem também percebeu isso. O mais estranho de tudo é que no fim daquele ano, dois novos romances foram publicados pela mesma editora. Um se chamava “O irmão na janela de um trem” e o outro se chamava “O irmão na janela de um apartamento”.